Fonte: Valor Econômico
O iFood, plataforma que gerencia mais de 6 milhões de pedidos de entrega de comida por mês, recebe cerca de 6 mil currículos mensalmente de pessoas interessadas em trabalhar na empresa. O número já parece alto, mas surpreende como cresceu. Há alguns meses o departamento de RH da companhia recebia cerca de 300.
No ano passado, o iFood começou a investir em sua marca empregadora, estratégia mais conhecida no mercado como "employer branding". Trata-se, primeiro, de ter uma cultura corporativa bem delineada e de investir em gestão de pessoas para que a empresa seja um bom local para se trabalhar. Depois entra o marketing para mostrar esse ambiente ao mercado e despertar nas pessoas o desejo de trabalhar na companhia. "O iFood era conhecido pelo serviço que oferece, do ponto de vista do cliente, mas as pessoas não sabiam que somos uma empresa legal para trabalhar", diz Tiago Luz, diretor de recursos humanos da empresa.
Com uma estratégia gia de comunicação definida, o iFood passou a contar para as pessoas que há desafios complexos na empresa, apesar de o produto final parecer simples, o que pode ser um atrativo para muitos profissionais. Além de contratar uma pessoa na área de comunicação para trabalhar no departamento de RH - ela responsável pela estratégia de marca empregadora -, o iFood passou a destacar histórias reais de seus funcionário sem sites como LinkedIn e Love Mondays.
Outra iniciativa foi a criação da hashtag #eusouifood. "Percebemos que alguns funcionários compartilhavam de forma espontânea momentos da rotina de trabalho", diz Luz.
O investimento em "employer branding", diz o executivo, resultou em um aumento no número de currículos recebidos. "Além disso, chegam mais profissionais com aderência aos valores do iFood, porque estamos contando para as pessoas como as coisas são feitas na empresa", afirma. Hoje, o iFood tem 650 funcionários no Brasil e contrata cerca de 50 pessoas por mês.
A preocupação das empresas com sua imagem como marca empregadora é crescente no Brasil, ainda que não esteja tão disseminada. "O investimento ainda se concentra em multinacionais americanas e europeias, mas começa a aparecer em grupos nacionais e até em pequenas e médias empresas", afirma Milton Beck, diretor regional do LinkedIn para a América Latina.
Um estudo da rede social mostrou que há um custo adicional de quase US$ 5 mil por funcionário contratado quando o empregador não investe em sua reputação. Entra nessa conta, principalmente, o custo com "turnover", mas não só. "A empresa que investe em sua reputação contrata mais rápido e atrai por outros fatores e não apenas pelo salário", explica Beck.
Outro levantamento, também do LinkedIn, mostra que metade dos candidatos nem considera trabalhar em uma empresa sem uma boa marca empregadora, mesmo que a oferta de salário seja alta. "Cenários de desemprego mascaram um pouco a necessidade de se investir em marca empregadora e o tema acaba ficando menos relevante para as empresas. Mas, quando a economia melhora, a necessidade de trabalhar a reputação aumenta", afirma.
Jorge Vazquez, presidente da Randstad no Brasil, vê mudanças no cenário brasileiro. "A economia no Brasil é de altos e baixos e a situação do mercado de trabalho hoje já é diferente de uns anos atrás. Em algumas áreas há inclusive, disputa de talentos", diz.
O Mercado Livre também começou a investir em "employer branding" no ano passado, na mesma época que inaugurou seu novo escritório, batizado de "Melicidade", na Grande São Paulo. "Foi uma decisão estratégica fortalecer a marca como empregador, então começamos a fazer ações mais fortes e definir frentes de trabalho", diz Helen Menezes, gerente de recursos humanos do Mercado Livre.
Uma delas foi abrir as portas da sede para eventos gratuitos de temas como tecnologia e recursos humanos. Helen explica que o local é um símbolo da cultura da empresa e foi projetado seguindo os valores e o "jeito de ser" da companhia, que tem política de "portas abertas", ambiente que favorece a inovação e a comunicação fluida. Ela também dá espaço para os funcionários atuarem como empreendedores dentro da empresa. Levar pessoas de fora para conhecer o local de trabalho é, portanto, uma forma de divulgar o Mercado Livre como marca empregadora.
Em 2017, foram realizados 117 eventos na "Melicidade", atraindo mais de 5 mil pessoas para o local. Um deles tinha justamente o objetivo de recrutar pessoas para a área de tecnologia. O IT Recruiting Day teve 340 inscritos. Os interessados participaram de testes e desafios, fizeram entrevistas com líderes de área e, no fim do dia, cinco pessoas foram contratadas. "Tentamos mostrar o nosso diferencial em relação a outras companhias", diz Helen. Hoje, o Mercado Livre tem 1.850 funcionários no Brasil e estima contratar cerca de 500 pessoas em 2018.
Com uma linha estratégica parecida com a adotada pelo iFood e pelo Mercado Livre, Vazquez, da Randstad, diz que a marca empregadora é uma extensão do conjunto de valores da marca para o consumidor. "As empresas passaram a perceber que seus diferenciais também podem atrair novos talentos e engajar os atuais funcionáios", afirma.
Na L'Oréal, a estratégia de comunicação para divulgar a marca empregadora da companhia tem dois pilares principais. O primeiro é conteúdo. "Queremos mostrar para uma ampla gama de profissionais, com backgrounds diversos, o que a empresa faz e quais são as nossas marcas", diz Sara Mariotti, diretora de gestão de talentos da L'Oréal Brasil. Para isso, a fabricante de cosméticos e produtos de beleza divulga nas redes sociais como é trabalhar na empresa, além de expor alguns projetos que são feitos pelas equipes.
No Instagram @lorealtalentos, dedicado somente a divulgar o que acontece dentro da companhia, a empresa publicou recentemente uma foto da equipe vestindo bermuda, informando que ali é permitido trabalhar com esse tipo de roupa no verão. Outra foto mostrou que profissionais da L'Oréal da França vieram ao Brasil para treinar a equipe de planejamento.
O outro pilar adotado pela companhia é o chamado "employee advocacy". "Temos o compromisso de mostrar a empresa como ela é;, e o melhor jeito de fazer isso é o próprio funcionário dizer como é trabalhar na L'Oréal", afirma Sara. Por isso, passaram a ser produzidos vídeos e textos com histórias de carreira dos trabalhadores e, mais recentemente, o canal oficial de carreiras da empresa no Instagram passou a republicar fotos postadas por funcionários em suas contas pessoais que tenham relação com o trabalho.
"Essas duas frentes geram uma quantidade de informação e de conteúdo relevante sobre a L'Oréal Brasil, e isso permite que os candidatos a uma vaga tenham mais base para escolher se querem trabalhar conosco", diz Sara. Segundo a executiva, o RH percebeu há; algum tempo que as pessoas que mais se desenvolvem na companhia têm seus valores pessoais alinhados aos da empresa. "O critério de sucesso tem tudo a ver com o 'fit' cultural", diz.